“Mãe Preta” é uma composição dos músicos brasileiros Matheus Nunes e Antônio Amábile, mais conhecidos como a dupla gaúcha Caco Velho e Piratini. Apresentada pela primeira vez em Portugal em 1954 pela fadista Maria da Conceição, a canção, cuja letra denuncia a realidade da escravidão, foi censurada pela ditadura salazarista. Em 1955 Amália Rodrigues resgatou esta canção no filme “Les Amants du Tage”, já com nova letra de David Mourão-Ferreira e novo título: “Barco Negro”, sucesso que, segundo Amália, foi o responsável por levá-la ao Olympia e fazê-la internacional.
No Brasil, investigadores como Fiuza (2006), Oliva (2016), Lopes e Nogueira (2019) dedicaram-se a recontar e a analisar as histórias a que esta canção deu lugar. Estes múltiplos trabalhos já publicados referem-se a histórias de repressão, desinformação, ressignificação, sucesso e apropriação. Efetivamente, “Mãe Preta” nasce como uma toada, primeiramente gravada em 1943 pelo conjunto brasileiro Tocantins. A canção conhece o mundo interpretada como fado através da voz de Amália Rodrigues (1955), ganha novas letras em francês (Dalila, 1956) e em italiano (Amália Rodrigues, 1968), versão instrumental pela orquestra de George Melachrino (1958), cujo disco omite o nome dos verdadeiros compositores, e é regravada, no Brasil e em Portugal, por cantores como Ney Matogrosso (1975) e Dulce Pontes (1996).
Esta comunicação propõe uma revisão da literatura dedicada a este tema e tem por objetivo agregar e dialogar com novas informações fornecidas por arquivos como a Hemeroteca Digital Brasileira e o Museu do Teatro e da Dança, bem como pela literatura especializada na biografia da fadista Amália Rodrigues [Nery (2009), Santos (2020) e Carvalho (2020)]. Este exercício permite reunir os conhecimentos já existentes acerca desta canção-chave na carreira de Amália, registrar novos dados de pesquisa e analisar, sob perspectiva atualizada, as questões da censura, da autoria e da ressignificação aplicadas à música.